A Polícia Civil investiga um caso de assédio dentro de um consultório médico na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. Uma paciente acusou o cirurgião plástico José Ricardo Simões de falar sobre suas preferências sexuais e a questionar sobre “aventuras fora do casamento”. Em um áudio gravado pela vítima durante uma consulta, ele diz à paciente que gosta de se masturbar enquanto olha uma mulher. A vítima registrou ocorrência na última semana na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá. Nem o médico nem seu advogado se pronunciaram sobre o caso.
Na consulta em que o áudio foi gravado, ao avaliar a paciente nua José Ricardo a pede para virar de costas e diz “Que bunda, hein?”. Na sequência, exclama a frase: “Você é gostosa”. Depois de perguntar nome e sobrenome dela, ele continua: “Eu vou te confessar: eu gosto mais de ver do que transar. Gosto demais de (usa uma expressão equivalente a se masturbar) olhando uma mulher do que transar”. O cirurgião fala outras coisas inaudíveis, até que afirma: “Aquele dia que você veio aqui, de sainha, achei um tesão”, se referindo à segunda consulta da paciente.
Ele segue no assunto falando que outras mulheres sentam em uma determinada cadeira do consultório para se masturbar, e questiona à paciente: “Você não gosta de fazer isso não? Não gosta de se mostrar?”. Cerca de dois minutos depois, ele também pergunta se ela “gosta de aventuras sexuais” e “aventuras fora do casamento”.
Essa foi a última de três consultas que a paciente teve com o médico. A gravação foi feita sob orientação do marido da vítima, após ela relatar o que ouviu de Simões nas duas primeiras visitas ao consultório. Ela o procurou para fazer cirurgias plásticas de correção das próteses de silicone nos seios, preenchimento vaginal e uma lipoaspiração nas costas. Após visitar dois cirurgiões, no Leblon e em Ipanema, cujos orçamentos ficaram acima do que pretendia gastar, ela recebeu a indicação de uma amiga para realizar os procedimentos com José Ricardo Simões, que praticava valores mais baixos em seu consultório na Barra da Tijuca.
‘Parecia uma conversa de botequim’
Logo na primeira visita, acompanhada da amiga, ela relatou se sentir constrangida com a forma de abordagem do médico.
— Foi uma consulta inusitada, parecia uma conversa de botequim pela informalidade. A minha amiga me apresentou e ele disse de cara: “Nossa, gostosa ela, hein?”. Eu fiquei bem sem graça, principalmente por ser um médico e estar numa consulta médica, mas pensei que ele devia se sentir à vontade por ter alguma intimidade com a minha amiga. Ele chegou a dizer que eu era muito “milf” e que gostava disso (gíria em inglês que significa “mãe com quem eu gostaria de transar”). Eu nem sabia o que era e depois fui pesquisar — disse a vítima.
A paciente de Simões conta que falou com a amiga e com o marido sobre o estranhamento com o jeito do médico, mas decidiu reconsiderar e voltar em uma nova consulta para tirar dúvidas sobre a cirurgia.
— A primeira consulta ficou um pouco falha, fiquei com várias dúvidas. Meu marido perguntou como tinha sido e eu disse que ele era brincalhão. A forma de falar era um pouco sem noção de ética. Eu confesso que fiquei um pouco insegura sobre o profissionalismo dele, mas como ele cobrou um valor que estava dentro do meu orçamento e a minha amiga gostou do resultado, achei que valia uma segunda chance. Pensei de ele ter uma postura mais profissional se eu fosse sozinha, mas não foi o que aconteceu — conta ela.
Da segunda vez, ela relata que as insinuações ficaram mais explícitas.
— Ele intercalava falas sobre a cirurgia com insinuações como “Nossa, você é uma delícia”, “Você é casada?”, “Você tem uma cara de safadinha”, “Você é séria? Gosta de aventuras sexuais?” — relembra a vítima. — Eu, querendo fazer a cirurgia e não querendo dar um fora nele, desconversava, levava na brincadeira ou respondia mais séria: “Não, doutor”. Quando eu falava assim, ele parava e voltava à consulta. Mas passava um pouco e ele voltava a se insinuar para mim. Chegou a dizer “Se você quiser, eu faço até outras coisinhas”.
Marido disse para fazer gravação
Ao chegar em casa, ela contou para o marido o que houve, que a orientou a fazer a gravação e denunciar o caso à Delegacia da Mulher.
— Eu fiquei muito nervosa depois dessa segunda consulta. E depois da terceira ida ao consultório, quando fiz a gravação, eu passei muito mal, tive enxaqueca, chorei muito. Era para ser meu presente de aniversário. Às vezes, eu me sentia muito culpada por ter vivido essa situação. É muito louco esse sentimento — relata.
De acordo com a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá, as investigações estão em andamento e o autor foi intimado para prestar depoimento. Testemunhas e a vítima foram ouvidas, e mídias de áudio apresentadas por ela foram encaminhadas para o Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) para serem periciadas. Agentes realizam diligências para esclarecer todos os fatos. A Deam solicita que possíveis outras vítimas do mesmo autor procurem a Polícia Civil para que os casos possam ser investigados.
Por meio de nota, o Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj) informou que até o momento não obteve informações nem denúncias sobre o episódio relatado. A nota diz ainda que “em caso de qualquer tipo de infração ética, o paciente deve realizar uma denúncia ao Cremerj, que irá apurar com todo o rigor, seguindo os ritos do Código de Processo Ético-Profissional”. Caso seja comprovada a infração, o Cremerj informou que as punições vão desde advertência até cassação do registro profissional.
A reportagem procurou o cirurgião plástico José Ricardo Simões por diversas vezes por e-mail, telefone e aplicativo de mensagens. Em um primeiro telefonema, ele informou que gostaria que o advogado se pronunciasse sobre o caso, desligou em seguida e não retornou os contatos. O médico não informou o nome nem o contato do advogado que faz sua defesa.
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