Ao longo da história humana, a Lua sempre foi uma presença misteriosa e inseparável sobre a Terra. Sua suave força gravitacional define o ritmo das marés e sua pálida luz ilumina os rituais nupciais noturnos de muitas espécies.
Civilizações inteiras definiram seus calendários pela Lua, conforme ela surgia e desaparecia. Alguns animais, como os besouros-do-esterco, usam a luz do Sol refletida na superfície da Lua para ajudar na sua orientação.
Mais fundamentalmente, algumas teorias afirmam que a Lua pode ter ajudado a criar as condições que possibilitaram a vida no nosso planeta e até a dar início à vida na Terra, desde o primeiro momento.
Mas a Lua também está se afastando de nós. A cada volta do seu balé espacial extraordinariamente equilibrado em volta da Terra – em círculos, mas sempre sem piruetas, o que explica porque nós sempre vemos o mesmo lado da Lua –, ela vai gradualmente se afastando do nosso planeta, em um processo conhecido como “recessão lunar”.
Disparando lasers em direção a refletores instalados sobre a superfície lunar pelos astronautas da missão Apolo, cientistas conseguiram recentemente medir com absoluta precisão a velocidade exata de afastamento da Lua. Eles confirmaram que a Lua está se afastando à velocidade de 3,8 cm por ano. E, conforme isso acontece, nossos dias vão ficando cada vez mais longos.
“A força da maré na Terra reduz sua rotação e a Lua recebe essa energia na forma de impulso angular”, acrescenta.
Basicamente, à medida que a Terra gira, a gravidade da Lua em órbita do nosso planeta impulsiona os oceanos para criar a maré alta e a maré baixa. Essas marés, na verdade, são “volumes” de água que se estendem em forma elíptica, contra ou a favor da gravidade da Lua.
Mas a Terra gira sobre o seu eixo em velocidade muito maior que a órbita da Lua, o que significa que a fricção das bacias oceânicas em movimento no nosso planeta também arrasta a água com ela. Com isso, o volume de água move-se levemente à frente da Lua na sua órbita, que tenta puxá-la de volta.
Este processo suga lentamente a energia de rotação do nosso planeta, reduzindo sua velocidade, enquanto a Lua ganha energia, fazendo com que ela se mova para uma órbita mais alta.
Esta redução contínua da velocidade de rotação do nosso planeta significa que a duração do dia médio na Terra aumentou em cerca de 1,09 milissegundo por século desde o final dos anos 1600, segundo a última análise disponível.
Nenhum desses números parece preocupante, mas, ao longo dos 4,5 bilhões de anos de história do planeta, a mudança acumulada é muito significativa.
Acredita-se que a Lua tenha se formado cerca de 50 milhões de anos após o nascimento do Sistema Solar.
A teoria mais aceita é que uma colisão entre a Terra em formação e outro objeto com o tamanho aproximado do planeta Marte, conhecido como Theia, tenha arrancado um pedaço de material e fragmentos que se agregaram para formar o que hoje chamamos de Lua.
Distância maior e dias mais longos
O que fica claro a partir de dados geológicos preservados em faixas rochosas na Terra é que a Lua ficava muito mais perto da Terra no passado, em relação a hoje.
Atualmente, a Lua fica a 384.400 km da Terra. Mas um estudo recente indica que, cerca de 3,2 bilhões de anos atrás – quando as placas tectônicas da Terra começavam a se mover e micro-organismos oceânicos estavam devorando nitrogênio –, a Lua ficava a apenas 270.000 km da Terra, ou cerca de 70% da sua distância atual.
“Isso pode ter reduzido a diferença de temperatura entre o dia e a noite e afetado a bioquímica dos organismos fotossintéticos”, segundo Eulenfeld.
O que estudos como o dele revelam é que a velocidade da recessão lunar também não é constante – ela já aumentou e diminuiu ao longo do tempo.
Um estudo da geóloga Vanina López de Azarevich, da Universidade Nacional de Salta, na Argentina, indica que, cerca de 550-625 milhões de anos atrás, a Lua talvez estivesse se afastando em até 7 cm por ano.
“A velocidade em que a Lua se afasta da Terra definitivamente se alterou ao longo do tempo e irá se alterar no futuro”, afirma Eulenfeld. Mas, em grande parte da história, a Lua se afastou em velocidade muito menor que a atual.
De fato, vivemos atualmente em um período em que a velocidade de recessão é anormalmente alta.
A Lua precisaria ter se afastado à sua velocidade atual por apenas 1,5 bilhão de anos para atingir a posição onde se encontra hoje. Mas esse processo vem ocorrendo desde a formação da Lua, 4,5 bilhões de anos atrás. Claramente, seu afastamento era muito mais lento no passado.
A configuração atual dos continentes faz com que a bacia do Atlântico Norte casualmente tenha proporções exatas para gerar um efeito de ressonância, de forma que a sua água se movimente de um lado para o outro em velocidade próxima à das marés. Com isso, as marés são mais acentuadas do que seriam normalmente.
Waltham explica que é como empurrar uma criança no balanço. Ela irá chegar mais alto se cada impulso for coordenado com o movimento existente.
“Se o Atlântico Norte fosse um pouco mais largo ou mais estreito, isso não aconteceria”, afirma Waltham. “Os modelos parecem mostrar que, se você voltar alguns milhões de anos, a força da maré era menor porque os continentes estavam em posições diferentes.”
Mas é provável que essa mudança continue no futuro. Modelos preveem que uma nova ressonância da maré irá surgir daqui a 150 milhões de anos. E um novo “supercontinente” só será formado daqui a cerca de 250 milhões de anos.
Podemos então esperar que, um dia, a Terra não tenha mais a Lua?
Mesmo na velocidade atual de afastamento, não é provável que a Lua chegue a abandonar totalmente a Terra. O trágico fim do Sol provavelmente ocorrerá muito antes, daqui a cerca de 5-10 bilhões de anos. E a humanidade provavelmente terá sido extinta muito antes disso.
“O gelo, basicamente, suprime as marés”, explica Waltham. Ele observa que, cerca de 600-900 milhões de anos atrás, acredita-se que o nosso planeta tenha entrado em um período particularmente congelante, conhecido como Era do Gelo. E, naquela época, a velocidade de afastamento da Lua foi dramaticamente reduzida.
Mas é difícil prever o impacto futuro, que será parcialmente compensado pelas massas de terra que serão recuperadas à medida que o peso das placas de gelo for retirado delas e por outras complicações.
Teoricamente, o próximo grupo de astronautas que irá voar para a Lua no programa Artemis, da Nasa, vai poder verificar se observou seu planeta natal a uma distância maior do que a que viram seus predecessores do programa Apolo, 60 anos atrás – embora o ponto da sua chegada durante a órbita elíptica da Lua provavelmente seja mais determinante, já que a distância entre o apogeu e o perigeu varia em 43 mil quilômetros a cada 29 dias.
E, para quem fica por aqui, nossas vidas são breves demais para observar os picossegundos que são acrescentados à duração de cada dia que passa. Se você piscar os olhos, eles já se foram.
Crédito: g1.globo.com