Foram surfistas que pegavam onda no mar de Grumari no último sábado (13) que salvaram a vida de Nelson Nedy, o jardineiro arrastado pela maré e ilhado depois que uma onda o derrubou do Mirante do Roncador, na segunda-feira passada (8).
O sábado era o sexto dia de Nelson na Ilha das Palmas, um pedaço rochoso inabitado a um quilômetro e meio da Praia de Grumari — uma parte pouco movimentada do litoral da Zona Oeste carioca —, mas a três quilômetros do ponto onde o jardineiro caiu.
Até berrar por socorro aos surfistas, Nelson enfrentou, durante a semana, dores, sede e fome.
Ele ficou todo lenhado ao ser atirado do costão e, na ilha, só conseguiu comer dois limões e um pedaço de carvão.
Nesta segunda-feira (15), Nelson passou a manhã recebendo visitas, depois de celebrar o Dia dos Pais com a filha, no domingo (14).
Ele já queria ter voltado a trabalhar, mas continua se sentindo fraco, com alguns ferimentos, e ainda não consegue se alimentar direito.
Entenda, a seguir, como foi a semana de Nelson.
Seis dias, cinco noites
- Segunda (8)
Nelson contou que decidiu ir até o Mirante do Roncador, um ponto de observação na estrada que liga o fim do Recreio dos Bandeirantes à Prainha e a Grumari.
O mar já estava de ressaca, e Nelson ficou numa pedra admirando as ondas — o que é desaconselhável pelo Corpo de Bombeiros quando o tempo está virando.
“Teve uma onda que veio mais ou menos e jogou umas gotinhas. Eu disse: ‘Vou subir mais um pouco.’ Aí, coisa de segundos, já veio uma maior”, lembrou Nelson.
“A onda bateu em mim, e não consegui enxergar mais nada.”
“Só bateu a minha bunda na pedra. Não sei se eu quiquei, se bati na água, se afundei. Tentei fugir daquele pedaço e nadei mais para dentro. Mas estava muito forte, era só parar de bater que a maré ia te levando”, detalhou.
Por três quilômetros, a correnteza o levou para perto da Ilha das Palmas.
“Não tinha nada lá. Nada para se esconder, nada para ter abrigo. Fiquei só um pouquinho para me recuperar porque eu estava há muito tempo dentro d’água. Tive que tomar decisão de pular e caçar outro ponto”, conta.
“Caiu uma chuvinha, e eu abanava a mão nas gotinhas e botava na boca, porque eu estava com muita sede”, recordou.
O jardineiro conseguiu encontrar uma gruta de pedras, onde decidiu passar a noite. Ele relembra o frio que fazia, que até cobriu a cabeça com a camisa para tentar se esquentar, apesar de as próprias roupas estarem molhadas.
“Eu estava tão cansado que mesmo com frio eu consegui dormir. A noite passou tão rápido, o dia estava clareando, aí eu falei: ‘Vou ter que andar mais um pouco para ver se eu acho um algum outro lugar”, conta.
- Terça (9)
Nelson conta que nunca tinha ido naquela ilha, mas que decidiu andar pelas pedras. Ele encontrou uma corda usada por pescadores para fazer a travessia. Apesar do medo de a corda arrebentar, ele tentou subir por ela.
Foi assim que ele avistou uma barraca, erguida por pescadores para servir de abrigo. Usou outra corda para descer pelas pedras, passou por uma parte a nado. Ao chegar lá, achou dois limões: “Comi com casca e tudo pra não perder nada”, destacou.
No abrigo tinha ainda um cobertor e um colchonete. Segundo ele, foi a solução para enfrentar a chuva e o vento.
“Meu Deus, parece que eu ia vir para cá. Melhor do que ficar no tempo”, define.
Nesse dia, ele tambén encontrou duas garrafas de refrigerante com água no mato, uma delas com lodo. Ele bebeu uma e guardou a outra para outro dia.
Nelson decidiu usar o cobertor para tentar chamar a atenção de pessoas que via na praia, a distância. Com pedaços de bambu, fez uma bandeira, que ficou nas bases de metal que pescadores chumbaram na rocha — usadas para apoiar as varas.
“Eu via as pessoas na praia, mas ninguém me via. Pensei: Será que ninguém me enxerga aqui?’ Ninguém olha para a pedra para ver. Era muito longe”, afirma.
Ele também esperava que algum helicóptero o visse, mas nenhum passou pelo local.
Quarta (10)
Bateu o desespero: Nelson tentou nadar até Grumari, uma travessia de 1.300 metros.
“Pulei na água e fui nadando, cheguei até a metade, mas a maré foi me puxando para dentro do mar. Teve uma hora que eu larguei o corpo e fiquei deixando: ‘Agora seja o que Deus quiser, pode me levar.‘”
Mas Nelson conseguiu voltar à ilha.
Quinta (11)
Mais um dia tentando ser visto da praia. Nelson tentou até usar um pedaço de isopor como prancha, mas teve dificuldade para se deslocar e retornou à ilha.
“Bebi água salgada pura, tinha hora que eu economizava, bebi um pouco da doce pra esconder o sal da água só para molhar a boca”, disse.
Sexta (12)
A fome apertava, e, sem ter o que comer, Nelson engoliu um pedaço de carvão. “Eu vi na televisão macacos roubando carvão. Se o macaco come, eu acho que não é muito ruim, não. Mas aquilo ressecou mais ainda a minha boca e ficou preso no dente”, explicou.
Sábado (13)
A esperança de Nelson de beber água da chuva se esvaiu quando viu que a noite foi de estiagem. Foi então que um grupo de surfistas o avistou e acionou o Corpo de Bombeiros.
“Daqui a pouco eu vejo um jet-ski vindo lá embaixo! ‘Ai, meu Deus do céu, graças a Deus. Peguei a camisa, comecei a acenar, e eles me viram”, disse.
“Tem um maluco agarrado na pedra, à deriva! Calma aê!”, gritou um surfista.
Ele foi resgatado de helicóptero até a base dos bombeiros em Guaratiba e, de lá, levado para o Hospital Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca.
Crédito: g1