Casos como o de Maria, mulher vítima de violência doméstica, que escapou da morte dos tiros de seu ex-namorado, mas, quatro meses depois, teve sua vida encerrada a tiros pelo ex-marido, são rotineiras nas delegacias do País. Talvez o desfecho desse caso assuste mais, mas não é exceção a regra, infelizmente.
Na tentativa de mudar essa realidade, com números assustadores em Tanguá, Região Metropolitana do Estado, o delegado titular da 70ªDP (Tanguá), Mário Luiz da Silva, se uniu a equipe e passou a oferecer mais que do que registros de ocorrências e investigações. A delegacia tem realizado acolhimento, atendimento humanizado e pessoal.
Nada fora do que uma delegacia distrital de uma cidade interiorana pode oferecer. Não há luxo, mas há cuidado. Não há conforto, mas há apoio.
“Assim que eu vim para essa delegacia eu percebi que os números de registros que envolviam Maria da Penha eram grandes. E a gente precisava fazer alguma coisa”, contou o delegado. E ele fez.
Com apoio de outros policiais da unidade, e com ajuda do município, uma sala desativada da delegacia ganhou tinta nas paredes – embora ainda precise de uma obra- ganhou mesa, cadeira, cartazes e cuidado. Uma mesinha infantil com lápis de cor no canto da sala deixa claro que a criança é bem vinda.
O ambiente, reservado e longe das cadeiras do plantão policial, oferece atendimento diferenciado e exclusivo para mulheres e crianças vítimas do patriarcado, autoritarismo, machismo… vítimas de crimes domésticos, sexuais, morais e tantos outros que afetam a vida de milhares de mulheres.
“A mulher é vítima prioritária. A polícia civil está preocupada com a não revitimização da mulher. Historicamente, somos uma população preconceituosa, mas estamos trabalhando diuturnamente para mudar esse quadro. A mulher vai ferida física ou moralmente para a delegacia, e aqui precisamos fazer ela entender que ela vai receber apoio. Todos os policiais são orientados para que ofereçam um atendimento sensível e acolhedor”, explicou Mário Luiz.
Após o atendimento na delegacia, o policial responsável pelo atendimento exclusivo na “sala da mulher” já consegue, com apoio da gestão municipal, encaminhar a vítima para atendimentos psicológicos, abrigos, exames.
E dessa forma, os agentes da delegacia que registraram em 2021, quase um crime de violência contra a mulher por dia, representando mais 60% dos números de crimes gerais da distrital no ano, estão tentando mudar a realidade.
Contudo, com uma população estimada pelo IBGE em 2021 de 15.443 mil mulheres morando no município, romper com o laço da violência tem sido uma barreira.
“A mulher é a vítima e isso é o ponto principal. Mas, por diversos motivos, ela volta a se relacionar com seu algoz. Com isso, a relação vai ficando cada vez mais perigosa”, explicou o delegado, que “convive” com histórias de casais que estão juntos mesmo após a justiça expedir medidas protetivas.
“Pela lei esse homem já não pode esta perto da mulher. Mas ela deixa, ela quer. E, em alguns casos, só ela pode denunciar essa aproximação. Mas isso não tira o ponto de que a mulher é vítima. Ela é vítima histórica disso tudo. Vítima de uma vida inteira aprendendo que o homem erra e que precisa ser perdoado. Por isso é tão comum que mulheres vítimas de violências domésticas retornem para seus agressores por diversas vezes, até o final de fato acontecer”, explicou Sabrina Moura, assistente social atuante em atendimentos a mulher.
“Infelizmente, algumas mulheres não têm a “sorte” de poder refazer a vida. Tem sonhos e histórias interrompidas. Então, é importante que a mulher não arrisque, não confie. Ao primeiro passo em que ela sentir medo, rompa a barreira da violência. Pois o grito vira tapa, o tapa vira soco e o soco vira tiro, facada, sonhos interrompidos”, finalizou a profissional.
O atendimento especializado em Tanguá acontece na sede da própria delegacia, a qualquer horário. Em outras cidades, como São Gonçalo e Niterói, o atendimento exclusivo acontece nas Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher (Deam), mas todas as delegacias podem registrar crimes de Maria da Penha, violência sexual, física e moral.
Denuncie!
Ah, leitor, lembre-se: em briga de marido e mulher o vizinho pode não “meter a colher”, mas pega o telefone e liga para o 190. A responsabilidade é de todos nós.
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