ATUALIZANDO A HISTÓRIA (1ª PARTE)
Mediante honroso convite do general de Brigada Amauri Pereira LEITE (segundo na foto da direita para a esquerda), visitei a Fortaleza de Santa Cruz da Barra, em Niterói, no último dia 19/06. Ocasião em que tive a oportunidade de fazer uma verdadeira volta ao passado e reviver momentos que lá passei há 50 anos, quando servi na então Companhia de Escolta e Guarda do extinto Presídio do Exército, sediado no local à época.
O general Leite é o gestor do Setor de Sítios Históricos da Artilharia Divisionária da 1ª Divisão de Exército (AD1) e me fez o generoso convite depois de ler o meu texto “Memórias do Presídio — Fortaleza de Santa Cruz da Barra” (vide obra completa no site www.overmundo.com/banco de cultura/silva jardim/RJ). A visita me possibilitou não só rever antigos locais narrados no referido texto como também outros, a exemplo do espaço que abrigava a “Guarda do Xadrez” e o local onde havia o canil dos cães de guarda.
Observei que o antigo espaço administrativo da Fortaleza permanece basicamente o mesmo. Mas houve mudanças marcantes da época do Presídio: as casas/celas prisionais agora abrigam seções administrativas, embora continuem ostentando as antigas portas azuis com grades de ferro e as mesmas trancas da época. O reforçado e alto portão de ferro que separava a área prisional da parte administrativa foi arrancado, tendo ficado como reminiscências apenas as pilastras e os anteparos de ferro onde ele era afixado. O mesmo aconteceu com o outro portão gradeado que ficava ao fundo da área prisional separando-a da Guarda do Xadrez.
Do antigo canil, especialmente construído para abrigar os ferozes e pouco amigáveis cães dobermanns alemães que nos auxiliavam na guarda dos presos durante a noite, só restam os alicerces próximos ao grande e pesado portão de madeira que dá acesso ao centenário cais imperial na saída da antiga área prisional. Até mesmo o referido portão, antes sempre bem trancado, agora fica com a passagem franqueada à quem transita por ali. O pátio em frente às casas prisionais onde os detentos tomavam banho de sol e praticavam exercícios físicos, hoje é um estacionamento de veículos de militares.
O Presídio do Exército, criado em 1967 e extinto em 1982, era onde ficavam os acusados de participarem de guerrilhas e subversões durante o Governo Militar, iniciado em 1964 e terminado em 1985, assim como militares condenados por diferentes crimes. Por lá passaram nomes conhecidos como os professores Darcy Ribeiro e Baiard, o jornalista Nélson Rodrigues Filho, o capitão do Exército Juarez (comandante da guerrilha do Caparaó) e Amadeu Felipe, seu braço direito. Conforme conta o ex-preso político Umberto Trigueiros, que esteve no Presídio do Exercito até 1970, no seu depoimento à “Comissão da Verdade de Niterói”.
Durante cerca de duas horas eu, o general Leite, o major CELSO Gonçalves da Silva (primeiro da esquerda para a direita na foto) e o capitão Edmar Rainha SALES (primeiro da direita para a esquerda na foto) percorremos principalmente os pontos do aquartelamento relativos às dependências então ocupadas pelo ex-Presídio do Exército. O general Leite explicou que se empenha em conhecer e registrar a história da Fortaleza de Santa Cruz da Barra, assim como de outras fortificações que estão sob a sua responsabilidade. Segundo ele, algumas de minhas informações (que serão narradas e detalhadas em próximas edições) ajudaram a clarear dúvidas que ele tinha sobre a história do Presídio do Exército, bem como as suas reais dependências e funcionamento.
Revi também a capela de Santa Bárbara que atualmente celebra missas abertas ao público. O que naturalmente não acontecia na época do Presídio. O que também acontece com a visitação turística que atualmente é aberta para o público em geral sem a “burocracia” e as questões de “segurança” previamente impostas e exigidas no tempo do Presídio. Entusiasmado em falar a respeito da história da santa e da igreja, o general contou sobre a relíquia com fragmentos de ossos de Santa Bárbara recebida diretamente do Vaticano.
Fato que me despertou a atenção: no momento mesmo da minha entrada no seu gabinete, o general, que durante a visita revelou-se um fervoroso e dedicado católico, orientava a escolha e separação de apetrechos religiosos (cálices dourados, entre outros instrumentos sacros) os quais estavam sobre a sua mesa de trabalho e que seriam utilizados numa próxima missa na capela de Santa Bárbara. Ato e cena totalmente inimagináveis de acontecerem ali na época em que aquele mesmo espaço era ocupado pelo comando do então Presídio do Exército. (Continua na próxima edição).
(Evaldo Peclat Nascimento é Jornalista, Professor, Poeta e Conselheiro do Conselho Municipal de Cultura de Silva Jardim. Serviu no Presídio do Exército de 1974 a 1980, onde foi Cabo).